domingo, 31 de março de 2013

Competição de Pecados

Boa noite!

Antes de mais nada, Feliz Páscoa blogueiros!!! Então, pra encerrar esse feriado de páscoa, compartilho com vocês um texto de Fabricio Carpinejar sobre o pecado e o que as pessoas esperam de quem os redime!!! Curtam ai!!!

A mãe me telefona avisando que está leve e feliz, foi na missa confessar.
Lasquei, de bobo:
— E aí, qual a sentença?
— Três ave-marias — ela respondeu
— Tá brincando, mãe? Que penitência ridícula. Agora entendo a decadência da igreja: não consegue nem mais condenar.
— Para, não faço nada de errado.
— Mas você contou que era minha mãe ou se omitiu?
Ela desligou na minha fuça.
Completei a primeira comunhão e a crisma, e jamais compreendi como os padres calculavam nossos pecados.
Na hora de confessar, confiava que o padre consultava uma tabelinha de delitos. Um taxímetro da transgressão.
Na minha visão de menino, haveria uma rigorosa avaliação de erros e seus respectivos números e pesos. O Vaticano preparava uma escala oficial de dívidas morais e despachava para todas as sedes, com um carimbo da Santa Sé.
Consistiria em longa lista, de crime e castigo.
Masturbação: 10 ave-marias e dois pai-nossos.
Cusparada: 20 ave-marias e dois pai-nossos.
Tapa: 30 ave-marias e quatro pai-nossos.
Puxar cabelo de irmã: 35 ave-marias e quatro pai-nossos.
Soco: 40 ave-marias e quatro pai-nossos.
O padre teria uma calculadora e faria a soma das confissões. O julgamento seria objetivo como a tabuada.
Mas não era o que acontecia, e não é o que acontece.
É um dos grandes males da Igreja Católica.
A subjetividade do julgamento sempre gerou inveja e concorrência nos pecadores.
Ficava com ciúme de Anamara que contava os mesmos pecados do que eu e recebia penas brandas. Por quê?
Levantava algumas hipóteses. Primeiro, que não importava o que dissesse, o padre falava com a minha mãe antes e já incluía as molecagens secretas e silenciosas.
Ou que meu anjo-da-guarda denunciava minhas baixarias por debaixo de suas asas.
Devido à injustiça divina, Anamara se ajoelhava alguns minutos para cumprir seu ato de contrição e logo brincava com nossos amigos e eu permanecia por noventa minutos no banco de madeira narrando um clássico entre São Judas Tadeu e São João Batista.
Só podia ter a influência de um delator! Como explicar que meu pecado basicamente consistia em brigar com o irmão e ganhava a sentença de 120 ave-marias e 20 vinte pai-nossos?
Não roubava, não colava nas provas. Deus costumava exagerar comigo.
No mundo doido dos adultos, o problema não se mostrava diferente.
Pais iam de paróquia a paróquia caçar padres compreensivos. Lembro de ouvir conversa de minha tia com a manicure em salão de beleza, enquanto esperava a irmã:
— Vai lá na paróquia do São Geraldo, eu traí meu marido e tive que rezar somente vinte ave-marias…
— Não pode ser? De verdade? Vinte?
— Sim! Ele é muito mais moderno. É um jovem de cinquenta anos. Dá gosto de pecar!
Nos anos 70 e 80, enxergava uma migração de fiéis, que procuravam um porta-voz complacente e simpático em outro bairro.
Ninguém desejava diminuir seus pecados, apenas encontrar um ouvido mais generoso.
O que não é ilegal. A fé não tem regras claras.

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